Capítulo 36 — O Segredo de Gabriela

O Segredo de Fernanda

Capítulo 36 — O Segredo de Gabriela

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Eu já me preparava para sair de casa mesmo, queria muito ir morar com o Fê e a Carlinha, mas essa proposta de morarmos todos juntos numa casa grande eu realmente não sabia o que esperar. Eu estava feliz mas confusa.
O que eu queria na verdade era ele só pra mim, mas sei que isso não era possível e também não era justo com as outras meninas e eu não exigiria isso dele.
Eu amo o Fê com todas as minhas forças e amo também as meninas, mas sem ele eu ainda seria aquele homem asqueroso que eu tanto odeio, sem o Fê eu provavelmente nem existiria mais.
Cheguei em casa, era bem cedo, a noite havia sido de sexo intenso, eu dei muito meu bumbum e comi todas as meninas, chupei todas elas menos a Marjorie, minha situação com ela não estava resolvida ainda e por enquanto eu estava evitando esse conflito.
Entrei na ponta dos pés, minha mãe estava dormindo no sofá, a porta rangeu e ela me viu
— Daniel! — Falou em alto e bom som
Fechei os olhos respirando alto, eu tinha corrigido ela mais de cem vezes mas ela insistia, e eu acho que era apenas para me irritar, eu estava cansada, exausta e queria só dormir.
— Oi mãe, cheguei. — Respondi cansada.
Ela me olhou de baixo em cima
— Você anda vestido assim o dia todo é?
— Mãe, estou cansada, quero dormir, a senhora precisa de algo?
— Ah, a princesa está cansada é? — Ela ironizou
— Estou! — Falei quase num sussuro
— E quantos homens você pegou essa noite? Ganhou muito dinheiro
— O que?
— Você tá se prostituindo Daniel, eu sei!
Eu estava curvada pelo cansaço mas ergui minha postura
— Me prostituindo? — Falei com a voz alta — Me prostituindo?
Ela se apequenou, voltou a sentar no sofá
— Eu levanto cedo todo dia, passo uma hora me aprontando para ficar bonita, feminina com maquiagem e roupas tudo para evitar dar um tiro da na cabeça e a senha nunca me trata do jeito que eu quero no feminino
Ela foi falar algo mas eu interrompi
— Eu saio cedo dessa porra pra trabalhar, você sabe onde eu trabalho, se você quiser é só ir conferir, fico das oito da manhã até  as oito da noite na maioria dos dias por que eu quero um futuro pra mim, anseio pelo dia que eu poderei sair dessa casa.
— Ah você quer ir embora, não ta bom o meu teto pra você?
— Seu teto? Esse é o Teto do meu pai, e em meia duzia de palavras que ele me falou ele me respeitou mais do que a senhora em dezoito anos
— A porta da rua é serventia da casa.
— É mesmo, eu sei, e eu vou dar um jeito nisso agora! — Gritei e subi as escadas apertadas
Entrei no meu quarto e peguei a mala que a Carla havia me dado e comecei a colocar minhas roupas. peguei duas mochilas que eu tinha, velhas e surradas e coloquei meus documentos, bijuterias, bateria, carregador, tudo o que eu precisava naquele momento, o que não desse eu buscaria depois.
Assim que saí do quarto puxando a mala e com duas mochilas meu pai apareceu
— O que foi Filha, o que está acontecendo?
— Eu vou embora daqui, chega de ser humilhada
Ele me puxou pelo braço
— Calma, o que houve?
Minha mãe subia a escada
— Essa mulher não me respeita — Até aquele momento eu estava firme mas então desabei de chorar — Ela prefere que eu morra do que eu seja o que eu preciso ser.
— Tá, calma — Meu pai me puxou e coloquei a cabeça no peito dele, ele era bem alto –  O que você ta pensando em fazer? ir embora?
— Sim, eu não quero mais ficar aqui, minha vida aqui é horrível.
Ele me empurrou e nos olhamos nos olhos
— Gabi agora né? — Ele me perguntou e eu fiz que sim com a cabeça — Gabi, você é adulta e sabe o que quer da vida, você tem mesmo que ir atrás da sua felicidade. Eu gostaria que você desse mais uma chance para essa casa, sua mãe ela é uma velha chucra de igreja, é dificil pra ela aceitar isso.
Eu ri das palavras dele, sempre gostei do jeito cômico que ele tratava as coisas
— Eu não sou chucra!
Ele apontou pra ela
— Você quieta! — O Silêncio foi mortal — Vai lá embaixo e prepara um café pra gente, já vamos descer.
Minha mãe desceu pisando duro.
Ele tirou as mochilas da minha mão e minha mala, entrou no meu quarto. Acho que fazia mais de uma década que ele não entrava ali.
Sentou-se na minha cama e bateu na cama para eu sentar do seu lado.
Sentei e dei uma respirada funda de alivio
— Mais tranquila?
— Sim, obrigada.
Ele olhou em volta no quarto, um armário simples branco, alguns quadros de bonecas, detalhes rosas e então riu
— Só não via quem não queria né! — Me olhou sorrindo
— É — Respondi envergonhada.
— Mocinha, assim, como eu disse, a sua mãe é uma pessoa ignorante e depois que ela entrou pra igreja ela está cada vez pior.
— É eu sei — Respondi olhando pra baixo.
— Ela virou uma carola, já tentei conversar com ela mas todos os meus argumentos caem sempre em coisa do demônio, então meio que deixei o diálogo de lado.
— Eu queria que você me desse mais uma chance, só uma, de arrumar as coisas.
— Arrumar o que pai, o senhor sempre foi perfeito.
— Acho que ausente é a palavra que você procura né?
Eu sorri sem jeito, realmente ele era muito ausente, eu o via pouco, nos falávamos pouco mas ele sempre era atencioso, carinhoso e engraçado nos momentos necessários.
— Se você optar por ficar, eu irei te dar mais atenção e tentarei com todas as minhas forças dobrar a sua mãe para que ela ao menos te respeite, mas não sei se ela vai te aceitar como é.
— E o que seria respeito e não aceitação? — Perguntei intrigada
— Posso tentar que ela te trate no feminino ou que não force chamá-la de Daniel para te ofender, ou usar um pronome ou adjetivo masculino apenas com o intuito de te fazer ma, mas não posso mudar o pensamento dela, apenas o tratamento que terá com você.
— Entendo pai — Pensei por uns instantes — Não quero dor de cabeça para o senhor
— E se você sair daqui, você iria pra onde? Tem um plano?
— Eu tenho, mais ou menos, na verdade, eu tenho pra onde ir.
— É um namorado? — Ele se corrigiu — Ou namorada, eu não sei como você pensa sobre isso.
— É uma espécie de namorado sim pai, mas sobre seu questionamento, pra mim não faz diferença se for menino ou menina.
— Entendo — Ele respondeu e seu olhar era distante — Então você vai agora?
— O Senhor quer que eu fique? — Perguntei procurando seu olhar
— Eu quero — Ele respondeu me olhando nos olhos — Não tenho direito de pedir isso pra você, mas a minha opinião é que você deveria ficar.
Um pequeno silêncio se estabeleceu no quarto, ficamos nos olhando
— O Senhor queria mesmo uma filha?
Ele sorriu
— Sempre quis uma filha! — Falo animado — Ainda mais bonita assim — Apontou pra mim
Fiquei envergonhada, arrumei o cabelo.
— O Senhor acha que eu estou bonita?
— Bonita não, está linda, parecendo uma boneca, aposto que os homens te jogam varias cantadas
Eu ri e disse:
— Eles jogam sim, isso é bom, faz bem para o ego.
— Eu quase tive uma filha — Ele falou e se explicou — Digo, biologicamente falando.
— É, como? — Perguntei curiosa, eu já não chorava mais. Abri as malas e comecei a desfazer enquanto conversávamos, era um papo bom e agradável.
— Sua mãe te contou que você é gêmea né?
— Sim, ela falou, mas que o meu gêmeo foi absorvido durante a gravidez.
Ele ficou em silêncio
— Pai?
— Não foi bem assim
— Não foi bem assim? — Levantei uma sobrancelha, fiquei curiosa — Foi como?
— Vocês nasceram, Você e e Ela, ambas vivas
Minha respiração ficou ofegante.
— Eu tenho uma irmã gêmea?
— Aí que está, como sempre sou ausente — Ele se levantou — Eu estava em outro estado a trabalho, vim o mais rápido que pude — Vi lágrimas brotarem de seus olhos — Mas quando cheguei a Danielle havia falecido.
— Por que nunca me contaram isso antes?
— Por que foi uma historia confusa e cheia de mágoas, sua mãe me acusou de ser ausente e negligente com a família e providenciou o enterro do corpo sem que eu estivesse presente, pois eu demorei dois dias para voltar
Fiquei estarrecida, era uma informação nova que eu não sei se me afetava diretamente ou não, mas me deu uma melancolia e o ódio por aquela mulher apenas subiu.
Ele se preparou para sair do quarto.
— Não tenha raiva da sua mãe, ela é uma pobre coitada, é vitima dela mesma.
Dei um lenço para ele e ele se encostou na parede.
— E tem uma coisa que vem me comendo a alma a alguns dias, e que eu preciso que você saiba, mesmo que isso custe esse pingo de respeito que temos um pelo outro.
Fiquei mais assustada, podia vir outra bomba e algo terrível podia ser dito, me arrependi de ter devolvido às roupas ao armário.
— Acho que a culpa do que aconteceu com você, do que você é…. é minha…  — Ele falou abaixando a cabeça
Me aproximei e coloquei dois dedos no seu queixo erguendo sua cabeça e olhando-o nos olhos
— Como assim? 
— Olha, eu nunca fui em psicologo e nunca contei isso para ninguém. Você precisa entender, eu sou de uma outra época, onde as coisas eram diferentes e coisas que são aceitáveis hoje eram terríveis e punidas com a morte há uns quarenta anos atrás.
— Pai, não estou entendo, seja claro por favor.
— Eu sou como você Gabi! — Ele falou abrindo os braços, depois colocando as mãos no bolso envergonhado
Fiquei olhando para ele, não entendi exatamente o que ele quis dizer
— Como assim igual a mim?
— Eu também sou uma mulher em um corpo de homem!
Fiquei estarrecida e assustada, minha respiração ficou ofegante
— Você, Você, o Senhor também se vestia de mulher
— Não — Ele respondeu seco
— Por que não? — Perguntei num misto de euforia e ansiedade
— Como eu disse, era uma outra época, era diferente.
E desde quando o senhor sabe disso?
— Desde uns oito anos de idade — Mais ou menos a sua idade quando você percebeu né?
— Sim, você sabia o que eu era? — Perguntei em lágrimas
— Sempre desconfiei, mas isso me aterrorizava, tinha medo que você se revela-se e sofre-se pois o mundo não gosta de nós
— De nós? — Perguntei chorando
— De você — Ele respondeu entristecido
Abracei ele 
— De nós pais, de nós, somos iguais!!! — apertei e choramos abraçados
Ainda abraçados ele falou
— Isso provavelmente é genético, então, me desculpa por fazer isso com você.
Empurrei ele devagar
— Pai, ainda da tempo, eu te ensino o que eu sei
— Não Gabi, não se preocupe comigo, eu já transformei essa vontade em mágoa, depois em raiva, depois em ódio e engoli isso deixando bem guardado
— Não pai, ainda dá sim.
— Não queria, por favor, não insista comigo, eu não quero passar o que me resta como uma bicha velha e ridícula, aliás, depois de cinquenta anos como homem eu não conseguiria esquecer isso. O tempo para mim já passou, é o seu tempo agora.
Dei outro abraço nele.
— Você me desculpa? — Ele falou sussurrando
— Pelo que que? — Perguntei
— Por ter passado esse defeito pra você.
— Isso não é um defeito pai, é uma dádiva, obrigada por me dar esse dom.
— Obrigada pai!
Ele me apertou forte.
Desfizemos o abraço e ele arrumou meu cabelo
— Quanta coisa né? — Ele me falou — Acho que falei demais
— Bastante coisa, mas eu sou forte, preciso processar tudo.
— Vamos tomar o café da cobra, assim ficamos fortes
— Vamos!
Rimos e nos preparamos para descer, agora de mãos dadas.

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Rafaela Khalil é Brasileira, maior de idade, Casada. Escritora de romances eróticos ferventes, é autora de mais de vinte obras e mais de cem mil leitores ao longo do tempo. São dez livros publicados na Amazon e grupos de apoio. Nesse blog você tem acesso a maioria do conteúdo exclusivo.

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