Capítulo 82 – Criptografia
— ME AJUDA FÊ PELO AMOR DE DEUS! — Gritei em desespero olhando para Fernando, ele era a unica pessoa que podia me ajudar a unica que eu não abandonei e podia recorrer.
Nesse momento ouvi um zumbido, um celular.
Fernando levantou o dedo para mim e saiu do banheiro, voltou segundos depois com uma toalha enrolada na cintura.
— Ele não esta na cidade hoje né?
— Ele quem? — Perguntei tentando saber a quem ele se referia
— Seu marido — Mesmo diante da minha situação desesperadora o olhar de Fernando era tranquilo
— Ele esta longe, mas volta hoje a noite, ele acha que eu estou trabalhando.
— Não acha não, ele sabe que você está aqui.
— Não sabe não! — Falei aumentando meu tom de voz
— Cris, ele ta vindo pra cá te procurar, ele tem um rastreador no seu celular
— Rastreador? — Olhei meu celular — Onde?
— O Seu celular é o Rastreador, o fato de ele existir já serve como rastreador
Fiquei olhando para meu aparelho, era um Smartphone, é claro que tinha jeito de instalar alguma coisa e mandar sinal GPS para ele.
— Ele me ligou agora pouco, eu disse que estava na corporação, no banheiro.
— Ele sabe que é mentira, ele veio para te pegar no pulo.
— Ai meu deus! — Me desesperei, meu coração bateu forte, coloquei Fernando em risco, minha irmã, meu sobrinho tudo! — Foge daqui, corre, eu fico
Fernando sorriu e se aproximou, passou a mão em meu rosto e tirou a mecha do cabelo que estava no rosto e colocou atrás da orelha
— Você veio até mim por que confia em mim, correto?
— Sim — Eu não confiava nele exatamente mas era o mais próximo que eu tinha de alguém de confiança — Mas isso já ficou mais perigoso do que eu imaginava eu queria só sua opinião.
— Cris, faz tempo que sua irmã demonstrou preocupação com seu sumiço, então, um amigo meu detetive me fez um favor, ele seguiu você e seu marido durante um tempo
Assim que falou pegou o celular e começou a mexer
— Então, ele fez isso pra mim — Me mostrou o aparelho
Na tela um mapa com vários pontos:
Carla
Márcia
Marjorie
Fernanda
Paula
M
Gabi
Gabi (Pai)
Gabi (Mae)
Cris
Paulo (Cris)
Mariana
Fabio
Alicia
— Paulo Cris? — Olhei o nome do meu marido associado ao meu — O que é isso?
— É um rastreador GPS, está no celular dele, no seu e no de todas as meninas
— Por que você rastreia a gente, somos policiais, você não pode fazer isso
— Você quer mesmo discutir a legalidade de algo que vai salvar sua vida nesse momento?
Fiquei sem palavras então ouvi batidas na porta, Fernando foi atender, olhei pela beira da porta do banheiro, não estava vestida.
Um homem negro e grande apareceu na porta, Fernando deu as costas e veio até mim.
— Me da seu celular — Ele falou pegando o celular da minha mão
— O que vai fazer? — Perguntei sem resistir
— Vou te ajudar, foi o que você pediu não foi?
— Foi — Respondi quase num chiado.
Ele se virou e foi até a porta, entregou o celular ao homem que apenas fez sinal com a cabeça e saiu
— Onde ele vai com meu celular? — Perguntei preocupada
— Onde ele vai não é importante, o importante é que seu marido vai atrás dele e vai perder um bom tempo. — Ele olhou no relogio do aparelho dele e continuou — Daqui a três horas você vai ligar para o telefone dele de um aparelho fixo, e vai dizer que teve o celular furtado, isso é pra colocar ele em desvantagem pois ele não vai admitir que tem um rastreador em você.
— Como você sabe disso tudo? Por que?
— Eu sou precavido, muitas coisas ruins já me aconteceram e eu tenho uma rede de ajuda que envolve bastante gente.
Fiquei apenas observando, ele entrou no banheiro passando por mim, entrou na banheira ainda com a toalha e disse
— As boas maneiras e as regras de amizade dizem que eu devo oferecer uma bebida quente para quem está triste, mas nesse motel não temo chá, só café e sei que você não gosta de café, logo, um banho quente vai te relaxar mais do que uma bebida quente.
Tirou a toalha e vi seu corpo definido nu com poucos pelos e ele entrou na banheira devagar
— Está muito quente, vem — Esticou a mão pra mim.
Eu não sabia o que pensar, era muita informação, muita coisa, um turbilhão, muito sentimento, pânico, medo, confusão. O que iria acontecer, como eu iria explicar, o que iria ser feito com meu celular? Por que tinha um rastreador no meu aparelho e por que Fernando rastreava todo mundo?
Um estalo de dedo chamou minha atenção
— Oh, Cris, vai ficar aí no frio? Está arrepiada
Olhei para meus braços, estava completamente arrepiada sim, mas não sei se era de frio, olhei para ele e vi a mão esticada em minha direção, peguei nas pontas dos dedos dele e senti minha mão agarrada com força, ele me puxou e entrei na banheira, ficando em pé.
— Você pode entrar de lingerie, mas ela vai ficar molhada depois que você se vestir — Ele colocou as duas mãos nos olhos — Tira, eu não vou olhar
A espuma começava a ficar volumosa, eu estava usando calcinha e sutiã além de coletes com coldres com armas. Me virei de costas e me despi completamente, colocando tudo longe do alcance da água.
Entrei e me afundei na espuma, a água estava bem quente e senti meu corpo se arrepiar, estava realmente uma delícia
Ele me olhou e sorriu, puxou meu pé para ele e massageou
— Calma, aqui você está segura, ninguém vem te pegar, procurar e nada de ruim vai acontecer com você.
Senti as lágrimas descerem meu rosto, eu não conseguia falar e tinha muito a ser falado, mas eu não queria enfiar o Fernando mais ainda nesse problema.
— Fique tranquila, temos tempo
Fiquei em silêncio enquanto recebia massagem nos pés por vários minutos, eu não conseguia ordenar meus pensamentos, então respirei e disse
— Tem mais, obrigada por me dar essa segurança mas não quero te envolver mais nisso
Ele riu, parecia um deboche
— Mais do que enganar um policial miliar e rastrear um policial federal e uma esposa de policial da Interpol filha de um embaixador?
Fiquei olhando fixamente para ele pensando no que ele havia dito
— Seu marido é o menor dos meus problemas Cris.
Percebi que ele também tinha preocupações, estava se expondo também
— Você precisa me ajudar e me dizer oque quer.
— Em que sentido? Da ajuda? — Perguntei confusa
— De tudo, com o que você me contou aqui já conseguimos a separação de vocês legalmente e uma ordem de restrição, você quer se separar dele?
— Quero! — Falei sem pensar muito, isso era algo que estava na minha mente a muito tempo, eu só não conseguia falar — É o que eu mais quero mas eu não consigo
— Isso está resolvido, vamos na delegacia da mulher e mostraremos suas cicatrizes, vamos mostrar as mensagens de assedio que ele tem contra você, te ameaçando
— Como você sabe das mensagens?
— Essa é a beleza da coisa, eu não sei, é um procedimento padrão desse tipo de pessoa, para mim é obvio que isso exista, e pelo visto acertei
— Acerto — Respondi falando devagar
— Minha proposta daqui pra frente é você vir morar comigo na minha casa nova, junto com as meninas, creio que lá conseguirei de proteger de maneira adequada mesmo dele, pois me parece que ele não vai aceitar isso de boa, correto?
— Correto — Pensei um pouco, lembrei do que me fez ir até ali, o gatilho final — Tem outra coisa, se ele estiver preso não vai conseguir me perseguir.
— O que tem mais? — Mesmo com todo o preparo dele isso parecia ser uma novidade, sua sobrancelha se levantou em surpresa
— O principal motivo de eu te procurar é que ele passou dos limites e isso me aterrorizou e pode me dar mais problemas do que eu posso suportar
Ele franziu a testa
— Que não pode suportar? Pelo que vejo sua tolerância à merda alheia é muito alta.
— Não Fê, é diferente dessa vez eu trouxe trabalho para casa, era um arquivo criptografado e eu estava tentando quebrar a criptografia
— Você é Hacker também? — Ele perguntou confuso
— Não, não sou — Pensei por um segundo — Por que também? — Ele não respondeu e eu cotinuei — Enfim, consegui quebrar a criptografia do arquivo e ver seu conteúdo
— E o que tinha dentro?
— Quando eu vi o que tinha dentro do arquivo não pude esconder meu rosto, fiquei pasmas e de boca aberta, eu não podia deixar ele ver o que tinha pois era coisa confidencial mas ele foi super agressivo comigo, tomou o notebook da minha mão e viu.
— E o que era? — Ele parecia aflito com meu suspense
Fechei os olhos e meu coração doeu, eu sabia que aquilo estava saindo de controle, minhas mãos tremeram e minha voz engasgou, não conseguia falar.
Senti a agua se mexendo e em seguida senti o corpo dele junto ao meu
— Ei, ei — Fernando pegou meu queixo — Pode falar, confie em mim, prometo que jamais falarei para ninguém o que você vai me dizer, se assim você quiser.
Acenei positivamente com a cabeça e respirei fundo
— Eram fotos de crianças nuas, transando entre si e com adultos.
Assim que eu terminei de falar ele tomou um choque, percebi que tanto a feição dele quanto a voz mudaram
— Crianças de quantos anos? — Ele perguntou gaguejando
— De todas as idades, de quatro, dez, quinze, mas isso importa? — Perguntei irritada
— Não,verdade, não importa
Ele colocou as duas mãos no rosto e apertou os olhos.
— E o que ele fez com isso? — Fernando perguntou ainda de olho fechados
— Ele pegou o computador e mandou as fotos para ele mesmo por e-mail mesmo comigo implorando para não fazer isso pois eu seria responsabilidade, iria perder o emprego e seria presa. Então ele pegou o meu notebook e disse que precisava olhar com mais calma para ver se eu não estava envolvida nisso, eu acho que era uma ameaça.
Fernando deu uma gargalhada e se levantou, o corpo cheio de espuma
— Por que está rindo? — Perguntei irritada
Ele esticou a mão pra mim
— Cris, você não vê? Ele cavou a própria sepultura, ele se fudeu, vamos, temos coisas a fazer.
Peguei na mão dele e saímos, nos vestimos e entramos no carro dele, ele colocou um fone de ouvido sem fio e começou a ligar no telefone, falando com algumas pessoas, eu estava assustada e cansada, nem conseguia prestar atenção no que ele falava.
Despertei quando ele parou em frente a um prédio, o prédio de onde eu trabalhava.
— Vamos subir, vamos conversar com seu chefe e contar tudo
— Não Fê, eu serei responsabilizada, posso perder meu emprego.
— Cris, qual é a alternativa?
— Ele me denunciar e eu ir presa por pornografia infantil
— Exato, vamos subir agora e explicar o que aconteceu, vamos colocar esse vagabundo torturador na cadeia
— Cadeia, não, eu não quero isso, ele não é uma má pessoa
— ACORDAAAA! — Fernando deu um grito e me assustou — Presta atenção no que você ta falando, o cara acabou com seu corpo, te cortou, te bateu, olha isso
Ele virou o retrovisor do carro para mim e vi meu rosto preto da surra da noite anterior, senti raiva e vergonha
— Cris, é errado o que ele fez, e o que vai fazer, vai espalhar mais aquela merda que ta no seu computador
Pensei nas crianças, era fruto de uma investigação, de arquivos de computadores pegos em batidas policiais para pegar uma quadrilha que espalhavam pornografia infantil. Não era comum levarmos arquivos para casa mas esse era um caso especial, eu tinha autorização para levar esse arquivo, não era nada clandestino, tudo era protegido por minhas senhas mas o problema é que meu marido tinha todas as minhas senhas.
— Ninguém mais vai sofrer — Sussurrei
— O que? — Ele perguntou se aproximando
— Ninguém mais vai sofrer! — Eu falei decidida
— Ótimo!
Fizemos o que Fernando propôs, subimos e fomos ao gabinete do chefe, o nome dela era Nadime, tinha cinquenta e três anos e era conhecida por sua severidade com as regras. Eu não vou mentir, quando entramos meu corpo tremeu de medo.
Sentamos e explicamos a situação, ela ouviu tudo atentamente sem interromper, assim que terminei de expicar, com Fernando me ajudando nos detalhes ela se levantou, colocou os óculos e andou em nossa direção
— Você é o que? — Nadine se dirigiu à Fernando
— Sou cunhado dela — Ele respondeu prontamente
— Não, o que você faz da vida senhor? — Nadine perguntou respeitosamente
— Sou empresario dos ramos Fitness e Maquiagem
— Entendi, o senhor por favor saia da Sala, preciso falar com a minha agente a sós
Fernando se levantou e saiu da sala sem falar mais nada.
Nadine foi até a porta e passou o trinco
— Tire a roupa, só a parte de cima.
Senti medo novamente, mas me levantei e fiz o que ela disse, fiquei imóvel parada. Senti ela se aproximando por trás e passando o dedo em vários pontos das minhas costas, das cicatrizes que eu sofri, das quelóides que se formaram.
Ela Deu a volta e parou na minha frente, pegou meu queixo e puxou meu cabelo para o lado olhando o ferimento mais recente
— Tsc tsc tsc — Fez com a boca junto com um sinal de negativo com a cabeça — Como você deixou isso acontecer menina? — Deu uma pausa olhando para mim, mas eu não respondi — Pode se vestir.
Me vesti rapidamente e em seguida perguntei
— O que vai acontecer comigo?
— Com você? — Ela voltou a mesa dela e abriu o Notebook — Por hora já aconteceu coisas demais com você. Então você vai ficar suspensa por uma semana a partir de agora.
Concordei com a cabeça
— São cinco dias que você vai ter para correr atrás dos papéis
— Que papeis? — Meu sangue gelou, eu seria demitida
— Dos papéis do divórcio
— Divórcio.
— Sim, estou entrando em contato com o Juiz já, vamos pegá-lo em flagrante logo mais, mas vamos colocá-lo na cadeia.
— E qual será a acusação? — Perguntei preocupada com ele
— A principal vai ser pedofilia e vamos indiciá-lo pela facilitação e disseminação desse mesmo material
— Mas ele não fez isso, ele só queria ver — Defendi, as palavras saíam da minha boca de forma quase automática, sem pensar.
Ela olhou pra mim por cima dos óculos
— Serão então dez dias senhorita Cristine e você terá que se tratar com psicologo e psiquiatra até que eu tenha um lauda da sua sanidade mental por que para mim você está com algo parecido com a síndrome de Stocolmo e está no limite.
— Mas eu… — Ela levantou a mão mandando eu parar
Pegou o telefone
— Vem aqui! — Ordenou
Uma agente que eu não conhecia, negra de cabelos curtinhos muito bonita entrou
— Pois não senhora — Ela falou de maneira respeitosa
— Hassem, Leve a agente para corpo de delito nos moldes do caso da semana passada ok?
— Ok — A agente Hassem olhou para mim e abriu a porta — Vamos?
Saí atrás dela, assim que cheguei na porta a diretora falou
— Peça para seu amigo entrar, quero falar com ele.
Saí e falei para Fernando entrar, ele sorriu e entrou. Fui fazer o exame em um hospital ali perto, fui analisada, medida e fotografada a agente não falava comigo, disse que tinha ordens pra isso.
Quando os procedimentos terminaram era tarde da noite e retornamos ao prédio. Fernando estava deitado em um sofá da sala de recepção dormindo.
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